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‘Comi insetos para sobreviver’: como Madagascar virou exemplo de fome e seca causadas por mudanças climáticas

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Madagascar está à beira de sofrer a primeira “fome causada pelas mudanças climáticas” do mundo.

Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), dezenas de milhares de pessoas já estão sofrendo níveis “catastróficos” de fome e insegurança alimentar após quatro anos sem chuva.

A pior seca em quatro décadas devastou comunidades agrícolas isoladas no sul do país, onde as famílias recorrem a insetos para sobreviver.

“São condições de penúria causadas pelo clima e não por conflitos”, afirma Shelley Thakral, do Programa Mundial de Alimentos das Nações Unidas.

A ONU estima que 30 mil pessoas estejam atualmente sofrendo o nível cinco de insegurança alimentar – o mais alto reconhecido internacionalmente – e há o temor de que o número de afetados possa aumentar muito quando Madagascar entrar no tradicional “período de escassez” antes da colheita.

“Isso não tem precedentes. Essas pessoas não fizeram nada para contribuir com as mudanças climáticas. Eles não queimam combustíveis fósseis… e, ainda assim, estão sofrendo as consequências das mudanças climáticas”, afirma Thakral.

Na aldeia remota de Fandiova, no distrito de Amboasary, algumas famílias mostraram recentemente a uma equipe visitante do PMA os gafanhotos que estavam comendo.

“Eu limpo os insetos o máximo que posso, mas quase não temos água”, conta Tamaria, mãe de quatro filhos, que não tem sobrenome.

“Eu e meus filhos estamos comendo isso todos os dias há oito meses, porque não temos mais nada para comer, nem temos chuva para poder colher o que plantamos”, agrega ela.

“Hoje não temos nada para comer, a não ser folhas de cacto”, afirma Bole, mãe de três filhos, sentada sobre a terra seca.

Ela conta que seu marido morreu de fome recentemente, deixando-a com mais duas crianças para alimentar. Um vizinho deles também morreu de fome.

“O que posso dizer? A nossa vida se resume a procurar folhas de cacto, repetidamente, para sobreviver.”

Como melhorar a gestão da água

Embora Madagascar sofra secas frequentes e muitas vezes seja afetado pela mudança de padrões climáticos causada pelo fenômeno El Niño, os especialistas acreditam que as mudanças climáticas possam estar ligadas diretamente à crise atual.

“No último relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês), observamos que a aridez em Madagascar aumentou. E isso deve se intensificar se as mudanças climáticas continuarem.”

“Podemos ver isso de várias formas como um argumento muito forte para que as pessoas mudem de atitude”, afirma o Dr. Rondro Barimalala, cientista malgaxe da Universidade da Cidade do Cabo, na África do Sul.

Observando os mesmos dados atmosféricos na Universidade da Califórnia em Santa Bárbara, o diretor do Centro de Riscos Climáticos, Chris Funk, confirmou a relação com o “aquecimento da atmosfera” e afirma que as autoridades de Madagascar necessitaram trabalhar para melhorar a gestão da água.

“Achamos que há muito que pode ser feito a curto prazo. Muitas vezes podemos prever quando vão ocorrer chuvas acima do normal e os agricultores podem usar essas informações para aumentar sua produção. Nós não somos impotentes frente às mudanças climáticas”, afirma ele.

O impacto da seca atual também está sendo sentido em cidades maiores do sul de Madagascar, com muitas crianças forçadas a pedir esmolas nas ruas para conseguir comida.

“Os preços no mercado estão subindo – três ou quatro vezes. As pessoas estão vendendo suas terras para conseguir dinheiro para comprar comida”, agrega Tsina Endor, que trabalha para uma organização beneficente, Seed, em Tolanaro.

Seu colega, Lomba Hasoavana, afirma que ele e muitos outros foram levados para dormir nos seus campos de mandioca para tentar proteger sua produção de pessoas desesperadas por alimentos, mas isso se tornou muito perigoso.

“Você poderá correr risco de vida. Acho muito, muito difícil porque todo dia preciso pensar em alimentar a mim mesmo e à minha família”, afirma ele.

“Tudo o que é relacionado ao tempo agora é tão imprevisível. É realmente uma dúvida enorme – o que acontecerá amanhã?”, indaga.

Fonte: G1.

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