Quase um ano depois dos primeiros relatos de assédio sexual e moral contra o professor português Boaventura de Sousa Santos virem à tona, o Coletivo Internacional de Mulheres, que reune vítimas, divulgou carta aberta cobrando acesso ao relatório de investigação das denúncias. O documento está sendo produzido por uma comissão independente do Centro de Estudos Sociais (CES) da Universidade de Coimbra, onde o sociólogo ensinava. Ele foi afastado das funções quando as acusações vieram à público.
“Não recebemos até ao momento qualquer resposta em relação à avaliação das nossas denúncias, nem qualquer compromisso de virmos a receber o relatório elaborado pela comissão independente”, diz um trecho da carta, divulgada nesta segunda-feira (4).
Por que isso importa?
O coletivo é formado por pesquisadoras e ex-alunas, brasileiras e portuguesas, que teriam sofrido abusos enquanto trabalhavam com o professor e sociólogo. A identidade da maioria dessas mulheres é mantida em sigilo. A deputada estadual Bella Gonçalves (PSOL-MG) faz parte do grupo. Em abril do ano passado, ela denunciou, com exclusividade à Agência Pública, que sofreu assédio sexual de Boaventura enquanto era sua orientada de doutorado, na Universidade de Coimbra. “A carta manifesta nossa indignação coletiva e sentimento de desamparo e impunidade. Não existe reparação real sem uma disposição institucional que confirme a mudança de condutas e a repetição de situações lamentáveis”, disse a deputada à Pública.
De acordo com a carta, o prazo final de divulgação do relatório sobre as denúncias contra o professor venceu no último dia 1 de março. A Universidade de Coimbra, entretanto, informou que o relatório será apresentado no próximo dia 13. O Coletivo pede acesso antecipado ao relatório, uma vez que, em abril do ano passado, endereçou uma carta à Universidade de Coimbra acusando Boaventura de assédio sexual, moral e extrativismo intelectual. Em 30 de setembro, o Coletivo de Mulheres enviou um amplo dossiê para o CES “com detalhes narrativos e elementos probatórios”.
“Enquanto denunciantes, teremos oportunidade de conhecer a validação ou não validação das nossas narrativas sobre a violência que sofremos semanas depois do relatório estar concluído e ao mesmo tempo que a comunicação social e o público em geral”, dizem na carta divulgada agora.
O Coletivo também critica o formato de divulgação anunciado pela universidade, que teria recusado o pedido de apresentação online. “O CES recusou o pedido do coletivo para divulgar online a apresentação do relatório, sabendo que a maioria das vítimas reside fora de Portugal e não tem condições materiais e emocionais para se deslocar às instalações da instituição”. De acordo com o CES, a apresentação do relatório será feita em uma sala do Centro com capacidade para 80 pessoas.
“Apelamos a que respeitem a nossa dignidade, não nos desumanizem, não voltem a silenciar-nos ou a fingir que não estamos aqui”, pede o coletivo. A Agência Pública entrou em contato com a Universidade de Coimbra, mas não recebeu resposta até a publicação.