Por Vitório Rafante, Especialista Tributário da Synchro
A Reforma Tributária, em curso no Congresso Nacional, promete transformar profundamente o sistema tributário-fiscal brasileiro. Entre os temas de maior complexidade, destacam-se os impactos para o Simples Nacional e a Zona Franca de Manaus, duas particularidades que oferecem incentivos críticos para o desenvolvimento econômico. A questão que se impõe é: como essas duas estruturas serão afetadas e o que as empresas devem fazer para se preparar?
O Simples Nacional, regime especial para pequenas e médias empresas, é indispensável para a economia brasileira. Atualmente, ele simplifica o recolhimento de tributos federais, estaduais e municipais, facilitando a vida de milhões de empreendedores. Contudo, a Reforma Tributária ainda gera dúvidas em muitos contribuintes, especialmente no que diz respeito à integração com o novo sistema de tributação, como o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS).
Uma das principais preocupações das empresas do Simples Nacional é a perda de competitividade. Quando essas empresas atendem ao consumidor final o impacto da reforma é minimizado, pois não há transferência de créditos nessa hipótese. No entanto, o cenário é diferente para aquelas que atuam como fornecedoras. Estas empresas, por enquanto, correm o risco de se tornarem menos atraentes, uma vez que o Simples Nacional não transfere a totalidade dos créditos tributários aos seus clientes.
Ao elaborar o PLP 68/2024, o Governo previu uma alternativa para esse impasse: as empresas optantes pelo Simples Nacional poderão optar por apurar e recolher o IBS e a CBS pelo regime regular destes dois tributos, ou seja, fora do DAS (Documento de Arrecadação do Simples Nacional), tornando-se aptas para apropriação e transferência integral do crédito tributário, o que as colocará em pé de igualdade com outras empresas. Todavia, é importante que os estudos da Reforma Tributária em discussão no Congresso Nacional se atentem para uma possível elevação da carga tributáriadesse segmento, que corresponde a uma parcela significativa das empresas brasileiras.
A Zona Franca de Manaus, por sua vez, enfrenta um desafio ainda mais complexo. Criada como uma política de desenvolvimento regional, a ZFM oferece uma série de incentivos fiscais como isenção do Imposto de Importação (II); isenção para produtos industrializados (IPI); diversas reduções e alíquotas diferenciadas para Cofins; reduções do IRPJ; diferimento, isenções e reduções de ICMS, entre muitos outros. No entanto, com a Reforma Tributária, surge a dúvida sobre a manutenção desses benefícios.
Em princípio, guardadas as devidas exceções, o PLP 68/2024 propõe diversas medidas incentivadas para manter a ZFM, dentre as quais destacamos as reduções a zero das alíquotas do IBS e da CBS incidentes sobre operação originada fora da ZFM que destine bem material industrializado de origem nacional a contribuinte estabelecido dentro da ZFM ou incidentes sobre operação realizada por indústria incentivada que destine bem material intermediário para outra indústria incentivada na ZFM; a suspensão da incidência do IBS e da CBS na importação de bem material realizada por indústria incentivada para utilização na ZFM ou a isenção quando os bens importados forem consumidos ou incorporados no processo produtivo; a redução a zero das alíquotas do IPI relativa a produtos industrializados na área da ZFM; créditos presumidos; entre outros.
Contudo, embora exista esse tratamento diferenciado da ZFM na Reforma Tributária, é essencial que os segmentos econômicos localizados nessa região se atentem para possíveis prejuízos, pois o novo arcabouço tributário pode não garantir a mesma paridade de incentivos que o sistema atual. A questão, portanto, consiste em saber se a reforma garantirá incentivos semelhantes aos que existem hoje ou se as empresas serão levadas a migrar para outras regiões, onde os custos possam ser mais baixos, mesmo sem incentivos fiscais. Há um risco de desindustrialização da região, o que pode agravar as desigualdades socioeconômicas no nosso país.
Além disso, setores estratégicos, como o de eletroeletrônicos, que se beneficiam fortemente da ZFM, podem perder competitividade internacionalcaso os incentivos fiscais sejam reduzidos. A manutenção de benefícios ligados ao comércio exterior continua sendo um componente fundamental para garantir que o Brasil continue competitivo no mercado global.
Recomendações para empresas
Diante desse cenário de incertezas, tanto as empresas do Simples Nacional quanto as da Zona Franca de Manaus devem adotar uma postura proativa para as possíveis mudanças.
Empresas do Simples Nacional: A chave será uma análise detalhada de sua posição no mercado. Se a empresa atua predominantemente no atendimento ao consumidor final, o impacto da reforma tende a ser menos significativo. No entanto, se for fornecedora de outras empresas, será essencial calcular se vale a pena optar pelo regime regular do IBS e da CBS, que permitirá a transferência de crédito, ou se é mais vantajoso permanecer no Simples Nacional, mesmo com possíveis perdas de competitividade.
Empresas da Zona Franca de Manaus: Para estas, o foco deverá estar na análise dos benefícios fiscais que serão preservados ou alterados pela reforma. Além disso, será crucial avaliar o custo-benefício de continuar operando na região, considerando fatores como custo de mão de obra, logística e incentivos fiscais. A migração para outras regiões só deverá ser considerada caso as vantagens fiscais da ZFM sejam efetivamente reduzidas.
Existem diversas emendas ao projeto de reforma em discussão no Congresso, e o cenário pode mudar. Portanto, as empresas devem acompanhar de perto as definições, realizar simulações fiscais e contar com assessoria especializada para adaptar suas estratégias à nova realidade tributária do Brasil.
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