Para tentar evitar ser identificado em uma organização criminosa, o militar condenado da Força Aérea Brasileira (FAB) por levar 39 kg usava um segundo celular para fazer as negociações. No aparelho, Manoel Silva Rodrigues (foto em destaque) registrava os contatos do crime com codinomes. O principal elo estava identificado como “Flamengo” e mandava mensagens começando com “oi, amor”.
De acordo com as investigações do Ministério Público Militar, o suspeito investigado por ser o traficante também é um militar e usa a expressão “oi, amor” com frequência para inicar as frases; ele também é torcedor fanático do Flamengo, o que justificaria o nome salvo no aplicativo de trocas de mensagem.
Pela denúncia do MPM, era “Flamengo”, que não teve o nome revelado pela polícia, era quem entregava as drogas para o sargento em motel no Núcleo Bandeirante. As autoridades chegaram a essa conclusão após saber que ele guardou um pente do estabelecimento na própria mochila.
A investigação chegou ao telefone após trocas de mensagens entre Manoel e a esposa, que seria cúmplice no esquema. No documento, chamou a atenção dos investigadores a esposa, caracterizada como uma mulher ciumenta, encontrar o aparelho usado para o crime escondido no sofá, ver as mensagens do “Flamengo” com o vocativo carinhoso e repassar o conteúdo ao marido sem abrir a conversa.
“Conhecendo a personalidade da investigada até então, a reação mais provável, na primeira conversa, seria ela abrir o celular, verificar quem teria enviado a mensagem, para depois brigar com o marido”, destaca a investigação. “No entanto, não foi isso que ocorreu. Ela, zelosamente, tira foto da tela do celular e a envia para o companheiro, para que ele tivesse conhecimento de que estavam querendo falar com ele no celular novo, por WhatsApp. Manoel, por sua vez, fala que, se a companheira abrir,terá que se passar por ele, contudo, se eles ligarem, era para ela não atender”, completou o trecho. Essa conversa ocorreu em 17 de junho, dias antes do vôo com a comitiva presidencial para Tóquio, com parada em Sevilha, na Espanha.
Relembre o caso do Sargento FAB:
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- Manoel Silva Rodrigues fazia parte de uma comitiva com 21 militares que acompanhava a viagem do presidente Jair Bolsonaro (PL) a Tóquio, no Japão, para reunião do G20;
- Antes de partir da Base Aérea de Brasília, Manoel recebeu a droga em um motel, no Núcleo Bandeirante;
- Ele foi preso no aeroporto de Sevilla, na Espanha, com 39 kg de cocaína na mala;
- A droga foi avaliada em 1.306.695 euros, o equivalente a R$ 6.399.083,62 na época;
- Em 2022, o ex-sargento foi condenado a 14 anos de prisão pela Justiça Militar. O sargento recorreu;
- Em 2024, o STM não só manteve a condenação como a aumentou para 17 anos.
A investigação sobre um segundo celular para ser usado no tráfico começou a ser considerada após a polícia identificar em outra troca de mensagem com a esposa.
O ex-sargento utilizou a linha telefônica nova para mandar mensagem à esposa se passando por outra pessoa para testar a fidelidade da companheira. Ela percebeu o truque e quis saber se o marido comprou o aparelho para mandar mensagens a outras mulheres em suas viagens. Segundo a investigação, o telefone seria usado para combinar os repasses de drogas.
As apurações apontaram para outras pessoas envolvidas, inclusive militares da FAB, mas somente Manoel foi condenado.
No fim de 2024, o Superior Tribunal Militar, última instância de apelação para militares, manteve a condenação do ex-sargento pelo crime de tráfico e aplicou a pena de 17 anos de reclusão. O Metrópoles entrou em contato com a defesa dele, que não se manifestou.
Militares condenados com drogas
O agora o ex-sargento é apenas um dos 641 militares condenados nos últimos sete anos por envolvimento com drogas, conforme revelou o Metrópoles. De 2018 a 2024, o STM condenou integrantes do Exército, da Aeronáutica e da Marinha.
Os dados das condenações foram obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI), com o detalhamento do tipo penal e das patentes dos envolvidos.