Alexander Coelho*
À medida que nos aproximamos das eleições municipais de outubro, a Inteligência Artificial (IA) se tornou um tema central na discussão sobre a modernização e a integridade dos processos eleitorais. Com a sua capacidade de processar grandes volumes de dados e oferecer insights em tempo real, a IA tem o potencial de transformar a maneira como as campanhas se comunicam com os eleitores, possibilitando uma maior personalização e eficiência na entrega de mensagens políticas. A automação pode facilitar a distribuição de conteúdo político relevante, assegurando que as propostas dos candidatos alcancem as audiências desejadas com precisão cirúrgica.
No entanto, o poder da IA não vem sem seus perigos inerentes. A ascensão dos deepfakes – conteúdos hiper-realistas gerados por computador que podem falsificar declarações de figuras públicas – ameaça semear a desinformação e minar a confiança nas instituições democráticas. A capacidade de replicar a voz e a imagem de um candidato com um alto grau de verossimilhança pode ser utilizada para fabricar notícias falsas, manipular a opinião pública e distorcer o discurso político. Além disso, a interação automatizada, embora eficiente, pode levar a uma desumanização da política, onde os eleitores se sentem mais como alvos de marketing do que como participantes ativos de um diálogo democrático.
Reconhecendo esses desafios, o Tribunal Superior Eleitoral tomou medidas proativas para delinear as fronteiras do uso aceitável da IA. A proibição de deepfakes visa proteger a veracidade do discurso político, enquanto as restrições ao uso de chatbots procuram garantir que os eleitores saibam quando estão interagindo com um ser humano e quando estão diante de um programa de computador. A responsabilidade imposta às redes sociais para combater a disseminação de discursos de ódio e conteúdos antidemocráticos reflete uma compreensão mais ampla do papel que as plataformas digitais desempenham na formação da opinião pública.
Legalmente, a regulamentação estabelece um terreno firme para ação contra aqueles que buscam subverter o processo eleitoral através do uso indevido da IA. As penalidades vão além de simples sanções financeiras, podendo incluir consequências criminais, dependendo da gravidade do ato e da extensão do dano ao debate público. A medida reflete uma crescente conscientização sobre a necessidade de uma governança tecnológica que seja ética e alinhada com os valores democráticos.
O papel da IA nas eleições é, assim, um reflexo da dualidade que caracteriza muitos avanços tecnológicos: a capacidade de servir ao bem público ou de se tornar uma ferramenta para a desinformação e a manipulação. As regulamentações do TSE são um passo significativo na direção de mitigar esses riscos, mas elas não são uma solução definitiva. A tecnologia continua a evoluir, e com ela, as estratégias para seu uso e abuso. Portanto, a vigilância deve ser constante, e as respostas, adaptáveis. A democracia brasileira no século XXI será moldada pela habilidade de equilibrar inovação e responsabilidade, garantindo que a tecnologia sirva aos princípios da justiça e da participação igualitária.
*Alexander Coelho – sócio do Godke Advogados, advogado especializado em Direito Digital e Proteção de Dados. CIPM (Certified Information Privacy Manager) pela IAPP (International Association of Privacy Professionals). É membro da Comissão de Privacidade e Proteção de Dados e Inteligência Artificial (IA) da OAB/São Paulo. Pós-graduando em Digital Services pela Faculdade de Direito de Lisboa (Portugal).
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