A Câmara Legislativa aprovou, na terça-feira, 18 de março, por 16 favoráveis e uma abstenção, o Projeto de Lei 1567/2024, que prevê a desafetação e reparcelamento de solo na área do Complexo Esportivo e de Lazer do Guará, onde estão as sedes da Administração do Guará, Feira, Fórum, o ginásio coberto e o estádio, o kartódromo, o Teatro de Arena e três instituições de serviços.
A desafetação permitirá a alienação de três lotes institucionais, totalizando 11.078,99m², e a destinação de uma área de 3.704,84m² para parcelamento futuro. Além disso, a proposta prevê a incorporação de outras áreas ao lote original para fins de regularização e planejamento urbano. O governo argumenta que a medida ajudará a otimizar a ocupação da área, prevenir invasões irregulares e garantir espaços adequados para atividades institucionais e comunitárias.
A desafetação de um bem público é um procedimento administrativo no qual a administração revoga a sua destinação de uso público, permitindo que o bem seja utilizado para fins diversos. O bem continua a ser público, mas deixa de ser aplicado para o desempenho das funções próprias do Estado.
O parcelamento vai permitir a conclusão do projeto de concessão da área, a chamada “PPP do Cave”, que Já foi concluído tecnicamente pela Secretaria de Projetos Especiais (SEPE) e liberado pelo Tribunal de Contas do DF, e terá licitação para a escolha do concessionário pela Secretaria de Esporte e Lazer. Era até agora o único entrave para a conclusão da concessão, depois que foi resolvida a situação do Teatro de Arena, retirado do projeto após protestos do segmento cultural do Guará.
O projeto vai à sanção do governador Ibaneis Rocha para que seja efetivado.
Era um lote só
Toda a área do Cave era até então um único lote, ocupado por Administração Regional, Feira do Guará, Casa da Cultura, Fórum do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT), ginásio coberto, clube de vizinhança, teatro de arena, estádio e kartódromo.
O parcelamento havia sido discutido com a população em audiência pública em maio do ano passado e desde então aguardava o encaminhamento do projeto por parte da Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação (Seduh) à Câmara Legislativa para votação, o que aconteceu nesta terça-feira, após a inclusão de sugestões encaminhadas pelos moradores da cidade.
Dos 20 lotes criados, 17 serão destinados ao uso de equipamentos públicos, podendo ser utilizados, por exemplo, por escolas, centros culturais e hospitais. Já os outros três lotes poderão ser ocupados por instituições públicas ou privadas, como bancos, academias e outros, de acordo com a Lei de Uso e Ocupação do Solo (LUOS). Para os 17 lotes voltados aos equipamentos públicos, a altura máxima das edificações a serem construídas ou mantidas será de 43,5 metros. Já os outros três lotes poderão ter, no máximo, 8,5 metros de altura.
Caminho livre
para a concessão
Após a suspensão do edital para a escolha dos concessionários há dois anos e meio e depois de lentas negociações para a retirada do Teatro de Arena do projeto, a concessão do Cave esbarrava na falta de parcelamento dos lotes de toda a área, projeto que foi apresentado em 2023 pela Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação (Seduh). Somente após a aprovação do parcelamento é que o projeto de Procedimento de Manifestação de Interesse (PMI), denominação da concessão, poderá ser concluído.
Somente no TCDF foram quase dois anos para analisar a retirada do Teatro de Arena, que foi concluída em julho do ano passado após negociações entre o governo e o segmento cultural do Guará, que resistia à cessão do espaço à iniciativa privada.
O estádio foi quase todo demolido há mais de dez anos, o ginásio coberto está interditado há seis anos e as quadras poliesportivas estão impraticáveis. Tudo à espera de uma concessão, a apelidada de “PPP do Cave”, anunciada há seis anos e lançada há dois anos e quatro meses, mas que não consegue sair do lugar por causa de interesses corporativistas de segmentos da comunidade, lentidão e excesso de burocracia de um tribunal de contas e falta de vontade política e de competência do governo (desde o anterior). Mistura-se tudo e temos o retrato do abandono de um espaço que poderia estar sediando jogos de futebol, shows, e sendo utilizado por praticantes de esportes.
Todo esse descaso começou no Governo Agnelo Queiroz, que na onda megalomaníaca de construir um estádio acima das necessidades de Brasília, inventou de criar um apêndice no Guará, para eventos para menos de 10 mil pessoas que ficariam boiando no imenso estádio Mané Garrincha, que tem capacidade para 70 mil pessoas. Pelo projeto, o estádio do Cave, o mais próximo do Mané, seria reformado e transformado numa arena multiuso, para abrigar, além de eventos culturais e de lazer, o futebol profissional. E o governo local até conseguiu um generoso recurso de R$ 8 milhões, que, somado a R$ 3 milhões da contrapartida do GDF, seria suficiente para refazer o velho e ultrapassado estádio do Cave. Mas, como quase tudo no governo – em todos do Brasil – as ideias não são acompanhadas de estudos e projetos técnicos prévios, esqueceram que o órgão que seria responsável pela obra, a Novacap, não possuía corpo técnico com capacidade e quantidade para elaborar o projeto a tempo dos recursos serem aproveitados antes do fim do orçamento do então Governo Dilma Rousseff.
A reforma do estádio até foi licitada e começou a ser feita, mas somente até a empreiteira que ganhou a licitação descobrir que haviam erros de cálculos dos custos e de estudos geológicos do terreno. Como não conseguiu convencer a Novacap a aumentar o orçamento ou oferecer um termo aditivo que tornasse a obra economicamente viável, a empreiteira desistiu de continuar e abandonou a reforma.
PPP
Já no Governo Rollembeg, que veio depois, surgiu a ideia de conceder todo o espaço do Cave à iniciativa privada, que ficaria responsável pela reformulação e modernização, em troca da exploração do que viesse a construir. A decisão, louvável, veio com a constatação de que não havia recursos suficientes para a reforma do complexo, ou que haviam outras prioridades de investimentos, e, principalmente, que não havia expertise e estrutura suficiente na Administração Regional do Guará para administrar o espaço depois de reformado.
Tudo caminhava bonitinho, com o projeto contratado através de chamamento público e o edital para a escolha do concessionário, lançado em fevereiro de 2022. Mas esqueceram de combinar com os russos, como diria o lendário Mané Garrincha. No caso, o segmento cultural do Guará, que, por motivos de corpo e até de tendência ideológica, protestou contra a “entrega de um patrimônio público à iniciativa privada”, e a perda do subutilizado Teatro de Arena, que até então não recebia sequer cinco eventos por ano. E, após pressão popular ao Tribunal de Contas do Distrito Federal, responsável por analisar denúncias que envolvam obras e concessões públicas, o movimento conseguiu convencer os conselheiros a suspender o projeto. E aí começaram as intransigências dos dois lados – enquanto o governo insistia em manter a concessão como tinha planejado, o movimento cultural não abria mão das suas convicções, até que, chegaram a um acordo, que incluía a retirada do Teatro de Arena do projeto. Imaginava-se que a partir daí, o andamento das providências da concessão seriam rápidas, o que, entretanto, não aconteceu. Nesse meio tempo, a Secretaria de Habitação apresentou o projeto de parcelamento do Cave em 17 lotes, distribuídos pelos equipamentos já existentes, incluindo instituições esportivas e sociais fora do governo.
Agora, finalmente, a situação do Cave será resolvida.
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