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Candidata é desclassificada do Enem por usar aparelho para doença rara

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DÉLIO ANDRADE
DÉLIO ANDRADEhttp://delioandrade.com.br
Jornalista, sob o Registro número 0012243/DF

Portadora de uma doença rara, uma moradora de São Sebastião foi desclassificada do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) após ter o uso de um aparelho eletrônico necessário para controlar a dor crônica na coluna negado pela organização do exame. Iranilde Rodrigues de Sousa, 49 anos (foto em destaque), foi direcionada para realizar o exame em uma sala privativa na Escola Classe 104, conforme recomendação médica, por ser uma pessoa com deficiência (PCD). Na chegada, informou aos fiscais que o aparelho, responsável por aliviar as dores, deveria permanecer ligado, e se ofereceu para deixar o controle com a equipe, mas foi em vão. Ela foi retirada da sala e teve a prova interrompida.

Ao se inscrever no Enem, Iranilde recebeu confirmação do próprio site do Inep de que teria as condições específicas atendidas, inclusive o uso do neuroestimulador necessário para controlar as fortes dores que sente na coluna. Ela contava que as adaptações solicitadas fossem garantidas durante a prova. Além disso, o controle do dispositivo é feito por um AirPod, que, por meio de um aplicativo, permite o ajuste da intensidade do neuroestimulador, conforme a necessidade da paciente.

Veja:

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O controle do dispositivo é feito por um AirPod, que, por meio de um aplicativo, permite ajustar a intensidade do neuroestimulador

O relatório destaca a presença de uma dor neuropática refratária caracterizada como “Síndrome de Cirurgia de Coluna Fracassada” e uma “Síndrome de Dor Complexa Regional”
Por ser alérgica a analgésicos como morfina, o neuroestimulador é a única alternativa de Iranilde para gerenciar a dor
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Iranilde recebeu confirmação do próprio site do Inep de que suas condições específicas seriam atendidas

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O controle do dispositivo é feito por um AirPod, que, por meio de um aplicativo, permite ajustar a intensidade do neuroestimulador

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O relatório destaca a presença de uma dor neuropática refratária caracterizada como “Síndrome de Cirurgia de Coluna Fracassada” e uma “Síndrome de Dor Complexa Regional”

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Por ser alérgica a analgésicos como morfina, o neuroestimulador é a única alternativa de Iranilde para gerenciar a dor

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Por ser alérgica a analgésicos opioides fortes, como morfina, o neuroestimulador é a única alternativa que resta a Iranilde para gerenciar a dor. “Eu sugeri que o controle ficasse com eles para ajustarem a potência conforme necessário, mas não aceitaram”, relatou.

Segundo Iranilde, o coordenador propôs que ela deixasse o aparelho desligado ao lado de fora da sala, podendo ligá-lo apenas sob supervisão, quando necessário. Iranilde argumentou que essa orientação a prejudicaria, pois não tinha tempo extra para fazer a prova e teria que se levantar frequentemente, o que interromperia tanto sua concentração quanto a dos demais candidatos.

Iranilde argumentou que, sem o aparelho, as dores ficariam intensas, dificultando a capacidade de realizar a prova.

“Eu avisei que isso ia me prejudicar, mas eles não permitiram de jeito nenhum. Me senti humilhada”, contou.

Mesmo em posse de documentos que comprovavam a condição e a necessidade do neuroestimulador, o coordenador insistiu que, sem autorização explícita do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), responsável pela aplicação da prova, o dispositivo não poderia permanecer ligado, levando à sua desclassificação.

A situação afetou emocionalmente Iranilde, que tentou deixar a sala para pedir ajuda, mas foi impedida de sair até o final do exame. Após duas horas de espera, conseguiu chegar ao portão da escola, onde foi amparada por dois policiais, sensibilizados com sua situação.

“Eu estava exausta, tremendo, com as pernas bambas”, desabafou. Os policiais, então, providenciaram uma viatura para levá-la em segurança para casa, uma vez que ela não conseguia se locomover sozinha devido ao desgaste emocional.

Veja o relato:

Após chegar em casa, Iranilde foi levada ao hospital pelo marido, onde foi medicada para estabilizar o estado emocional. “Eu não acreditava no que estava vivendo. Me senti um lixo. Fui medicada com Rivotril pela equipe médica”, desabafou.

De acordo com o relatório médico, Iranilde é acompanhada pela equipe de cirurgia de coluna há 6 anos e oito meses, e pela neurocirurgia funcional e da dor há dois anos e 11 meses. Ela apresenta um quadro de dor lombar irradiada para membros inferiores e região sacrococcígea, de características neuropáticas, com piora progressiva nos últimos anos, apesar de terapias medicamentosas e fisioterápicas.

Em 2019, Iranilde foi submetida a uma microdiscectomia com artrodese lombar, seguida por duas reabordagens cirúrgicas em 2020 e 2021, sem obter melhora significativa. Em janeiro de 2022, foram realizados bloqueios anestésicos em múltiplos pontos, mas as dores persistiram e se intensificaram.

Após diversas tentativas terapêuticas, em junho de 2022, Iranilde passou a usar o neuroestimulador medular definitivo, que trouxe alguma melhora na dor neuropática nas regiões de quadril, coxas e partes distais dos membros inferiores. Contudo, a dor na região lombar e sacrococcígea permaneceu. A partir de abril de 2023, novos bloqueios foram aplicados sem sucesso. Antes do teste com eletrodos medulares, a paciente relatava dor intensa (escala EVA de 9/10) na coluna lombar e sacrococcígea, com irradiação para o glúteo, virilha e períneo, além de parestesias nos membros inferiores, especialmente no lado esquerdo.

O relatório médico o qual o Metrópoles teve acesso destaca a presença de uma dor neuropática refratária caracterizada como “Síndrome de Cirurgia de Coluna Fracassada” e uma “Síndrome de Dor Complexa Regional” na área sacrococcígea e no pé esquerdo, o que limita severamente a locomoção e as atividades funcionais de Iranilde. Ela ainda passou por tratamento com neuromoduladores, opioides moderados e inúmeras sessões de fisioterapia, mas sem sucesso.

Iranilde registrou um boletim de ocorrência na delegacia eletrônica da Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) e lamenta a perda da oportunidade de realizar a prova, que considera fundamental para a realização de um sonho pessoal. “Tudo o que eu queria era fazer a minha prova, só isso. Senti que ignoraram totalmente a minha condição e me trataram com desrespeito”, declarou.

O Metrópoles procurou o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), mas não obteve o retorno até a última atualização desta reportagem.

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