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Com mais casos de falta de luz, Enel SP pagou 29% mais compensações em 2023 do que em 2022

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DÉLIO ANDRADE
DÉLIO ANDRADEhttp://delioandrade.com.br
Jornalista, sob o Registro número 0012243/DF

O valor pago aos clientes da Enel Distribuição São Paulo em compensações por falta de energia elétrica cresceu 29% entre 2022 e 2023, saltando de R$ 80,9 milhões para R$ 104,8 milhões. Os dados são da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e mostram uma tendência de aumento dos prejuízos à população atendida pela concessionária na região metropolitana de São Paulo.

A compensação é feita automaticamente por meio de um desconto na conta de luz, no máximo dois meses após a identificação do corte pela Enel. O cálculo que define o valor a ser abatido considera a frequência e a duração da falta de energia na unidade consumidora. A empresa tem obrigação de fazer esse ressarcimento, que não inclui as indenizações individuais movidas por clientes que tiveram danos maiores.

Em 2021, a Aneel aprovou uma mudança na regulação sobre as compensações. Com a nova regra, que entrou em vigor em 2022, domicílios que tiveram quedas de energia mais longas e frequentes passaram a receber descontos maiores na fatura. Por outro lado, houve um aumento no limite de tempo sem energia a partir do qual as concessionárias são obrigadas a ressarcir os clientes. Ou seja, as pessoas mais prejudicadas passaram a receber valores mais altos em compensações, embora menos clientes tenham direito ao desconto.

Mesmo com a mudança de regulação, a quantidade de compensações pagas aos clientes atendidos pela Enel SP cresceu: passou de 2,7 milhões em 2022 para 2,9 milhões em 2023, um aumento de quase 10%. Isso significa que houve mais ocorrências de longas faltas de energia que levaram ao pagamento de compensações.

Por que isso importa?

Sem investimentos para tornar a rede mais resiliente em casos de tempestades, Enel tem gasto mais nos últimos anos em compensações a clientes que ficam sem energia elétrica. Para especialistas, é um sinal claro de deterioração do sistema e algo que merece atenção especial quando a concessão for renovada, em 2028.

“É um indicador claro de que o sistema está se deteriorando continuamente. Mas, de longe, as compensações não cobrem o prejuízo verdadeiro aos clientes”, avalia Ildo Sauer, vice-diretor do Instituto de Energia e Ambiente da Universidade de São Paulo (IEE-USP). Ele se refere às perdas de alimentos que necessitam de refrigeração, por exemplo, que não são cobertas pela compensação automática e demandam que a pessoa lesada abra um processo contra a empresa.

Dados mostram uma tendência de aumento dos prejuízos à população atendida pela concessionária

Luiz Eduardo Barata, presidente da Frente Nacional dos Consumidores de Energia, também enxerga uma piora na qualidade dos serviços prestados pela Enel. “Não dá para lutar contra a realidade, as condições de atendimento da Enel são muito precárias”, diz.

Para Barata, uma possível explicação para esse cenário é que os indicadores de qualidade da prestação do serviço que estão no contrato de 2018, quando houve a transferência da AES Eletropaulo para a Enel Distribuição São Paulo, são os mesmos que já constavam no contrato de 1998, quando foi feita a privatização da estatal Eletropaulo.

“O contrato primário [de 1998] é de uma época em que não tínhamos essa quantidade de eventos extremos que temos agora. É fato que as condições de atendimento se degradaram, mas a questão é que a renovação da concessão [em 2028, quando termina o contrato com a Enel SP] precisa apertar muito os indicadores. É preciso que o contrato estabeleça indicadores mais rígidos para que a empresa possa agir mais intensamente frente aos eventos climáticos extremos”, afirma.

Enel funciona como “eletrobet” e aposta no risco climático para manter lucros, diz especialista

Até o momento, mais de 1,5 milhão de compensações foram pagas em 2024 pela Enel SP, o que corresponde a 53% do total de 2023. O número deve subir até o final do ano, já que ainda não inclui o apagão que atingiu 3,1 milhões de paulistas durante o fim de semana de 12 de outubro, após uma chuva com forte ventania que danificou a rede de distribuição de energia.

Em menos de um ano, a capital passou por três apagões – ocorreram também em novembro de 2023 e em março deste ano. Com exceção desse no começo do ano, que ocorreu por uma falha subterrânea, os outros dois escancararam a falta de resiliência das estruturas da Enel a eventos climáticos extremos.

Na visão de Sauer, a piora no serviço de energia prestado pela empresa tem relação com o modelo da privatização da empresa. “A Enel prefere pagar a compensação do que investir em modernização da rede, porque a estrutura tarifária que eles têm é essa. A tarifa é dada, tudo que eu gasto em manutenção preventiva, se eu puder evitar, vira lucro.”

Em 2023, a Enel Distribuição São Paulo teve lucro líquido de R$ 1,3 bilhão

A falta de investimento em melhorias na rede elétrica para prevenir novos apagões faz Sauer apelidar a Enel de “eletrobet”, em alusão às empresas de apostas que operam no país.

“O papel que é reservado para a distribuidora, de acordo com o contrato de concessão e com a legislação, não incentiva a modernização, porque ela não ganha nada com isso. Nem incentiva a manutenção preventiva, porque eles vão correndo o risco até que o sistema se deteriore. É a ‘eletrobet’, que aposta no risco. A Enel prefere arriscar e não fazer o investimento, já que [o valor pago com] a compensação vai ser bem menor do que o lucro que ela vai ter”, afirma.

Barata diz que já existe um consenso na Aneel a respeito da necessidade de “aumentar muito os investimentos em distribuição”, mesmo que isso não signifique uma quebra de paradigmas e se continue com a distribuição aérea da energia. Ele se refere ao debate em torno do enterramento dos fios, apontado como forma de minimizar os danos em casos de extremos climáticos, mas que tem dificuldades logísticas e orçamentárias, já que o custo da distribuição de energia tende a aumentar quando se tem maiores investimentos.

A Enel Distribuição São Paulo teve lucro líquido de R$ 1,3 bilhão em 2023, segundo reportagem do G1. O pagamento em compensações naquele ano correspondeu a 8% disso.

“Será que esse lucro não foi um pouco exagerado? Os consumidores são muito maltratados, é um problema do dia a dia. Os clientes têm aparelho queimado, têm comida estragada e encontram muita dificuldade para conseguirem um ressarcimento além da compensação”, afirma Barata.

Piora do serviço atinge todos os estados atendidos pela Enel

Além de São Paulo, a Enel também está presente no Rio de Janeiro e no Ceará. Em todos esses estados houve aumento no valor pago em compensações, mesmo após a mudança na regulação da Aneel.

No Ceará, onde todos os municípios são atendidos pela empresa, o valor das compensações subiu 35%, passando de R$ 27,1 milhões em 2022 para R$ 39,4 milhões em 2023. Até o momento, as compensações somam R$ 30,3 milhões em 2024, valor superior ao registrado em todo o ano de 2022.

O Rio de Janeiro teve o mesmo aumento percentual no período, de 35%. Em 2022, foram pagos R$ 31,7 milhões em compensações. Já em 2023, foram R$ 40,9 milhões. O ano de 2024 já é o segundo ano com maior montante de compensações no estado, com R$ 34,1 milhões.

Outro lado

A reportagem procurou a Enel Distribuição São Paulo para comentar sobre as compensações, mas não obteve retorno até a publicação.

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