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O dia em que o trabalhador parou

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DÉLIO ANDRADE
DÉLIO ANDRADEhttp://delioandrade.com.br
Jornalista, sob o Registro número 0012243/DF
Parafraseando a música de Raul Seixas, há vários dias diversos trabalhadores não saíram de suas casa, mas não porquê eles combinaram, não por conta de movimentos paredistas liderados por sindicatos, mas sim por conta da força maior chamada: Corona Vírus (COVID19), vírus este que se espalha no Brasil na mesma velocidade do que foi visto na Itália (país com a maior taxa de letalidade da doença).Sem dúvida nenhuma, o isolamento social determinado pelas autoridades Federais, Estaduais e Municipais, são de suma importância para a não -disseminação do vírus no território na nacional e, até onde sabemos, é a melhor forma de combate a pandemia e sua propagação.Todavia, o poeta não imaginaria que sua letra de música traria consequências tão desastrosas para a economia mundial e mortes para diversas idades e classes sociais, sendo que o Brasil, claramente, não estaria fora desta recessão.Os comércios de rua são de longe os mais afetados, empresas de turismo, academias, hotéis, empresas de aviação com risco de quebra, bolsa de valores despencando cada dia mais, tudo isto trás para nós uma sensação de desespero nunca antes vista no País. Com isto emerge-se um problema que pode matar mais que o próprio vilão: O desemprego.O desemprego de milhares de pessoas, que o próprio presidente do grupo XP Investimento disse que será na proporção de 40 milhões de desempregados (https://epocanegocios.globo.com/Economia/noticia/2020/03/epoca-negocios-xp-ve-desemprego-atingir-40-milhoes-no-brasil-sem-plano-marshall-de-verdade.html) e que só um plano estilo “Marshall[1]” poderia suavizar a situação catastrófica.Neste cenário de filme de catastrófico Hollywoodiano, é que foi criada a Medida Provisória 927/2020, restando a este Autor, escrevendo para seus 12 leitores, objetivar as mudanças implementadas às relações laborais, visando com que elas não se esfaçam de vez durante o combate ao Corona. Assim, vamos aos tópicos da MP:1. PRAZO DE DURAÇÃO

Primeiramente o prazo que durará tais medidas excepcionais, avocando-se o motivo da força maior, será o mesmo prazo que o Decreto instituiu a calamidade pública, qual seja: até o dia 31 de dezembro de 2020.

2. ACORDO COLETIVO EMERGENCIAL

Patrão e empregado pedirão, por escrito, entabular acordo que visa equalizar as obrigações trabalhistas, executando a Lei, Instrumentos Normativos e Negociais, mas sem afrontar os ditames do Art.  da Constituição Federal.

Neste diapasão, fica proibido:

a) Despedida arbitrária alegando motivo de calamidade como pano de fundo;

b) FGTS: que será suspenso a sua cobrança a tempo determinado, mas não se confundir com isenção;

c) Diminuição do salário, ao limite do Salário Mínimo, caso não haja piso salarial proporcional à extensão e a complexidade do labor;

d) Décimo Terceiro;

e) Adicional Noturno, não se confundir com horas extras e intervalos, que serão melhor abordados no tema Banco de Horas;

f) Proteção do Salário, tanto que a própria MP foi reeditada na data de hoje no ponto em que o salário ficaria suspenso por 04 meses;

g) Participação dos Lucros;

h) Salário Família;

i) Repouso semanal remunerado, este podendo ser também modificado com a compensação de banco de horas e tele trabalho;

j) Férias, também a ser abordado em tópico próprio;

k) Licença à gestante;

l) Licença-paternidade;

m) Aviso prévio proporcional ao tempo de serviço;

n) Adicionais de Insalubridade e Periculosidade;

o) Aposentadoria, consequentemente a postergação/suspensão dos depósitos previdenciários, já definidos em outros instrumentos normativos.

p) Diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil;

Os demais direitos não citados no art. 7º serve-se para não tornar mais fastidioso o presente artigo, mas vale a leitura para compressão dos direitos laborais, que são considerados para boa parte da doutrina e jurisprudência como direitos e garantias fundamentais, se assemelhando às Cláusulas Pétreas.

3. O TELETRABALHO

Poderá ser instituído ao critério da empresa o trabalho remoto, sem que exista de acordos individuais ou coletivos, dispensado o registro prévio da alteração no contrato individual de trabalho.

Entretanto, a alteração acima, tem que preceder de notificação ao empregado com antecedência de, no mínimo, quarenta e oito horas, por escrito ou por meio eletrônico (pode ser o WhatsApp).

As despesas e equipamentos serão custeadas pela empresa, mas se o empregado tiver meios eletrônicos para cumprir a quarentena em casa, este assim deverá fazê-lo e depois o patrão disponibilizará mais e melhores meios para o desempenho do labor.

Tudo tem que ser visto pelo prisma da excepcionalidade, caso não acalcaremos o objetivo proposto com o isolamento laboral. Vide art. 4º, § 3º da MP.

§ 3º AS DISPOSIÇÕES RELATIVAS À RESPONSABILIDADE PELA AQUISIÇÃO, PELA MANUTENÇÃO OU PELO FORNECIMENTO DOS EQUIPAMENTOS TECNOLÓGICOS E DA INFRAESTRUTURA NECESSÁRIA E ADEQUADA À PRESTAÇÃO DO TELETRABALHO, TRABALHO REMOTO OU TRABALHO A DISTÂNCIA E AO REEMBOLSO DE DESPESAS ARCADAS PELO EMPREGADO SERÃO PREVISTAS EM CONTRATO ESCRITO, FIRMADO PREVIAMENTE OU NO PRAZO DE TRINTA DIAS, CONTADO DA DATA DA MUDANÇA DO REGIME DE TRABALHO.

O Teletrabalho pactuado entre as partes estabelecerá a jornada, as peças ou tarefas a serem cumpridas, sendo que o tempo para a realização dos serviços não constituem tempo à disposição, regime de prontidão ou de sobreaviso, exceto se houver previsão em acordo individual ou coletivo.

Estagiários, aprendizes e outras formas de contratação também estão autorizadas para a implementação do Teletrabalho.

Não se aplicam aos trabalhadores em regime de teletrabalho, nos termos do disposto nesta Medida Provisória, as regulamentações sobre trabalho em teleatendimento e telemarketing.

4. A ANTECIPAÇÃO DE FÉRIAS INDIVIDUAIS

Durante o período da MP, pode o empregador antecipar as férias do empregado, devendo ser respeitado objetivamente os seguintes critérios:

  • Informação ao empregado da antecipação com o mínimo de 48 horas, por escrito ou por meio eletrônico (WhatsApp);
  • Indicação do período a ser gozado, respeitando o mínimo de 05 dias;
  • Gozo, mesmo que o empregado ainda não tenha direito aquisitivo;
  • Negociação ampla entre patrão e empregado;
  • Empregados do grupo de risco terão preferencia no gozo das férias, individuais e coletivas;
  • Pagamento do terço constitucional, podendo ser feito após o início do gozo ou até a gratificação natalina do empregado, sendo esta situação a escolha do patrão;
  • Conversão das férias em abono a escolha do empregador;
  • Pagamento das férias até o 5º dia útil do mês subsequente a imposição;

Infelizmente, e temos que bater palmas para os profissionais da saúde, policiais, bombeiros e etc…, verdadeiros heróis da nação, estes o empregador poderá suspender as férias ou licenças não remuneradas ou daqueles que desempenhem funções essenciais, mediante aviso, por qualquer meio, preferencialmente com antecedência de 48 horas.

5. A CONCESSÃO DE FÉRIAS COLETIVAS

Na mesma toada, seguem às regras objetivas de concessão de férias coletivas:

  • Não necessita de comunicação prévia ao órgão local do Ministério da Economia e a comunicação aos sindicatos representativos da categoria profissional;
  • Notificar o conjunto de empregados afetados com antecedência de, no mínimo, quarenta e oito horas;
  • Não se aplica ao limite máximo de períodos anuais e o limite mínimo de dias corridos previstos na CLT.

6. O APROVEITAMENTO E A ANTECIPAÇÃO DE FERIADOS

Os empregadores poderão antecipar o gozo de feriados não religiosos federais, estaduais, distritais e municipais, sendo que para isto deverão:

  • Notificar, por escrito ou por meio eletrônico o conjunto de empregados beneficiados, com antecedência de, no mínimo, quarenta e oito horas;
  • Indicar expressamente os feriados aproveitados;

Os feriados poderão ser utilizados para compensação do saldo em banco de horas, devendo, no entanto, os feriados religiosos conter a concordância do empregado, mediante manifestação em acordo individual escrito.

7. O BANCO DE HORAS

Fica autorizado a constituição de regime especial de compensação de jornada, por meio de banco de horas. Este instituto já consta livremente deferido na CLT (art. 59 §§ 2º e 5º), sendo que a diferença deste para aquele, encontra-se abaixo pontuado:

  • O banco de horas da MP 927/20, deverá ser estabelecido por meio de acordo coletivo ou individual formal, para a compensação no prazo de até dezoito meses;
  • Este período de compensação poderá ocorrer após a data de encerramento do estado de calamidade pública.
  • Tal compensação poderá ser feita mediante prorrogação de jornada em até duas horas, que não poderá exceder dez horas diárias.

As compensações aqui autorizadas, do saldo de horas, poderão ser determinadas pelo empregador independentemente de Convenção Coletiva ou Acordo Individual ou Coletivo.

8. A SUSPENSÃO DE EXIGÊNCIAS ADMINISTRATIVAS EM SEGURANÇA E SAÚDE NO TRABALHO

Foi dispensado os exames admissionais, mas não os demissionais. Todavia, tais exames poderão ser feitos até 60 dias após o prazo do fim da calamidade pública, bem como se o médico avaliador da empresa ou empresa de avaliação por ela contratada, constatar que o Trabalhador corre risco catalizador de algum auxílio securitário, este comunicará a ao empregador, tal necessidade.

Dispensa-se o demissional, se o ocupacional tenha sido realizado há menos de 180 dias.

Treinamentos períodos estão suspensos, previstos nas Normas de Saúde e Segurança do Trabalho, devendo tais serem realizados após 90 dias do fim da calamidade. Estes treinamentos também poderão ser feitos à distância.

Comissões de acidente permanecerão, mas os pleitos eleitorais destas poderão restar suspensos.

9. O DIRECIONAMENTO DO TRABALHADOR PARA QUALIFICAÇÃO

O Artigo 18 foi revogado hoje pelo presidente. Nele previa a suspensão do contrato de trabalho por até quatro meses, sem salário, para participação do empregado em curso de qualificação profissional não presencial, oferecido pela empresa ou por outra instituição. Essa suspensão poderia ser acordada individualmente com o empregado e não dependeria de acordo ou convenção coletiva, e poderia ou não a empresa dar um tipo de bolsa para a profissionalização, mas não de natureza salarial.

Tal artigo gerou diversas críticas da sociedade, juristas e principalmente dos parlamentares, estes últimos que votarão a conversão da MP em Lei ou não.

10. O DIFERIMENTO DO RECOLHIMENTO DO FUNDO DE GARANTIA DO TEMPO DE SERVIÇO – FGTS

Fica suspensa a exigibilidade do recolhimento do FGTS pelos empregadores, independentemente do número de empregados, regime de tributação, natureza jurídica, do ramo de atividade econômica e da adesão prévia, referente às competências de março, abril e maio de 2020, com vencimento em abril, maio e junho de 2020, respectivamente.

Ainda, tal suspensão, poderá ser recolhida de forma parcelada, sem a incidência de juros e multa, em 06 vezes, com vencimento no sétimo dia de cada mês, começando a partir de julho de 2020.

Para usufruir da prerrogativa o patrão deverá declarar as informações da suspensão até o dia 20 de junho de 2020, ficando suspenso também o prazo prescricional dos débitos relativos a tais contribuições suspensas.

Caso o pagamento seja feito em parcelas, tal qual explicado, a empresa poderá ter a seu favor um certificado positivo com efeitos de negativo, sobre a regularidade dos pagamentos fundiários.

11. DISPOSIÇÕES FINAIS

  • jornada de doze horas de trabalho por trinta e seis horas de descanso, para atividades insalubres, mediante acordo escrito;
  • Prorrogação da jornada constitucional, por força maior;
  • Permissão de escalar entre a 13ª e 24ª hora trabalhada, sem prejuízo do intervalo a ser concedido, podendo tais serem compensadas em 18 meses, por meio de banco de horas ou por horas extras;
  • Suspensão de 180 dias para o ingresso de recursos administrativos em razão de infrações trabalhistas;
  • Os casos de contaminação pelo coronavírus (covid-19) não serão considerados como acidente de trabalho, modalidade doença ocupacional, exceto mediante comprovação do nexo causal do empregador;
  • Prorrogação de acordos e convenções coletivas pelo prazo de 90 dias, contados de 180 dias da data da publicação da MP;
  • Autuação dos fiscais do trabalho ficarão condicionadas a; falta de registro de empregado, a partir de denúncias; situações de grave e iminente risco; ocorrência de acidente de trabalho fatal apurado por meio de procedimento fiscal de análise de acidente; trabalho em condições análogas às de escravo ou trabalho infantil.
  • Antecipação do Abono Salarial, a ser pago: cinquenta por cento do valor do benefício devido no mês de abril; a segunda parcela será paga em maio.

12. CONCLUSÃO

Esta Medida Provisória, para ser convertida em Lei, precisa ser votada no Congresso, mas é um instrumento normativo que visa desburocratizar as regras trabalhistas, visando não o seu descumprimento, mas sim a proteção do emprego.

Alguma destas medidas, a princípio, poderão ser vistas como retrocesso ou um desrespeito às normas legais protetivas do trabalhador, todavia em situações de exceção, como a que estamos vivendo, deverá ser encarada excepcionalmente, eis que o risco desemprego em massa durante e após a contenção do COVID19 é tão real quanto a própria doença.

Medidas outras estão sendo tomadas pelos Governos, como concessão de linhas de empréstimo para capital de giro a preços subsidiados e isto é salutar no momento em que vivemos.

Claro que os abusos devem ser denunciados, tanto para a Superintendência do Trabalho, quanto para o Ministério Público Trabalhista e a própria Justiça Laboral. Entretanto, precisa-se, com o Estado de Calamidade, dar mais autonomia à patrão e empregado, visando, como dito, proteger o emprego e das milhares de famílias que dependem desta tênue relação.

Brasília 22 de março de 2020.

18 horas e 12 minutos. (Corrigido às 14 horas e 57 minutos)

Marcos Martins Costa – Advogado.


[1] O Plano Marshall (conhecido oficialmente como Programa de Recuperação Europeia), um aprofundamento da Doutrina Truman, foi o principal plano dos Estados Unidos para a reconstrução dos países aliados da Europa nos anos seguintes à Segunda Guerra Mundial.

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