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O PCC, os usineiros e as eleições em São Paulo

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DÉLIO ANDRADE
DÉLIO ANDRADEhttp://delioandrade.com.br
Jornalista, sob o Registro número 0012243/DF

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O fogo continua a trazer danos ao interior paulista, embora em proporções muito menores do que no fim de semana de 22 a 24 de agosto, quando o número de focos de incêndio em três dias superou o total anual de queimadas de 2009, 2013, 2015, 2022 e 2023. Naquele período foram registrados 2.621 focos de calor – 1.886 apenas no dia 23 de agosto. Para se ter uma ideia, embora o registro de focos de calor tenha triplicado de segunda-feira para quinta-feira passada (5), ontem havia 16 focos de calor. 

Uma evidência de que, além de criminosos, os incêndios foram coordenados, concordam meteorologistas e empresários do setor sucroalcooleiro. A divulgação de um estudo do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam) mostrando que as colunas de fumaça se formaram em apenas 90 minutos, no dia 23 de agosto, colocou fogo na desconfiança. 

Houve gente que viu ali a mão de bolsonaristas – inflamados pela disputa com o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre Moraes, que deve tomar conta das manifestações deste 7 de setembro em São Paulo, convocadas pelo próprio ex-presidente Jair Bolsonaro. Também houve quem apontasse sem provas para o MST – que, aliás, teve um de seus acampamentos invadido com violência pela Polícia Militar na segunda-feira passada (2) em Valinhos (SP), enquanto os sem-terra ajudavam os bombeiros a apagar um incêndio.

Um tratamento bem diferente do recebido pelos produtores de cana, que viram o governo criar um posto avançado em Ribeirão Preto e aviões apagando os incêndios no coração do agronegócio paulista. De acordo com a Orplana, que reúne 35 associações de produtores de cana, foram constatados 2,1 mil focos de calor naquele fim de semana, além da queima de 100 mil hectares do canavial.  

Vendo-se como alvo principal dos incêndios, empresários do setor criaram sua própria hipótese: a de que o PCC teria colocado fogo nos canaviais em retaliação a denúncias feitas contra integrantes da facção por produtores de etanol. Comentei essa possibilidade com mais detalhes no terceiro episódio do videocast “Bom dia, fim do mundo!”, da Agência Pública (que entrou no ar dia 5 no nosso YouTube e nos tocadores de podcast). 

Ainda que não seja verdadeira, a hipótese dos empresários do etanol revela mais um setor atingido pela “diversificação de negócios” do PCC, que estaria com 1 bilhão de dólares (80% do lucro amealhado no tráfico internacional de drogas) para lavar e multiplicar em diversos ramos da economia brasileira, sobretudo a de São Paulo, sua terra natal.

De acordo com o próprio governador Tarcísio de Freitas, em declaração feita em maio, “o PCC tem mais de mil postos de gasolina no estado e agora está comprando usinas no interior paulista”. Uma acusação que foi repetida em junho por Rubens Ometto, presidente do Conselho de Administração da Raízen, uma joint-venture da Shell com a Cosan, a maior produtora de etanol no país. 

Aliás, não sabemos quem repetiu quem, já que Ometto, o maior doador da campanha de Tarcísio, é um integrante influente do Instituto Combustível Legal (ICL), presidido por Emerson Kapaz, que vem movendo uma cruzada contra fraudes no setor – os criminosos se beneficiam da sonegação fiscal e da adulteração de combustível para ofertar gasolina e etanol a preços menores. Segundo o ICL, as ações criminosas já trouxeram um prejuízo de R$ 30 bilhões para o setor e de R$ 14 bilhões na arrecadação de impostos. Daí o interesse que o PCC teria em adquirir, além dos postos de gasolina, as próprias usinas. 

O ICL diz funcionar como “um observatório privado” de ilegalidades no setor, repassando informações para a Secretaria de Segurança Pública e para o Ministério Público. Neste ano, já houve duas operações policiais de grande porte no setor de combustíveis, o que justificaria uma eventual retaliação da facção criminosa aos supostos autores das denúncias. 

O gatilho para a queima dos canaviais teria sido a cassação da licença operacional da quinta maior distribuidora de combustíveis no país, a Copape, no dia 3 de agosto passado. De acordo o Ministério Público de São Paulo, os donos da Copape seriam ligados ao PCC. 

Tarcísio já descartou a participação do PCC nos incêndios e qualquer ligação entre os 12 homens presos pela Polícia Civil por atearem fogo no interior, mas continua a se reunir com representantes do setor sucroalcooleiro, como fez na terça-feira passada. De acordo com o tenente Maxwell de Souza, da Defesa Civil, os empresários estão contribuindo com brigadistas, aviões e também com informações e imagens captadas pelos sistemas de monitoramento das próprias usinas, os mais precisos, segundo ele, para observar em detalhe os focos de calor. 

Embora o combate ao crime organizado tenha servido para o governador justificar ações truculentas da polícia, como aconteceu em Guarujá, não ficaria nada bem exibir tamanha vulnerabilidade diante de seus apoiadores do agronegócio paulista. Por outro lado, o setor dos combustíveis tem interesse em exigir mais fiscalização e repressão policial – e de quebra acusar os “altos impostos” pela atração da criminalidade para os seus negócios.

Talvez a gente não saiba nunca o que aconteceu além da seca e do vento naquele fim de semana incendiário, já que os jornalistas não estão conseguindo informações sobre as investigações. O certo é que a facção que se originou do massacre no Carandiru e se tornou uma holding do crime por uma trajetória de erros na política de segurança pública dos governos tucanos – que, como o atual, foram mais violentos do que inteligentes – está agora cada vez mais infiltrada na economia e na política do estado. 

Não apenas por ter amealhado R$ 200 milhões em contratos de prefeituras paulistas, sobretudo na região metropolitana de São Paulo e na própria capital. Na semana passada, ficamos sabendo que a Polícia Civil de Mogi das Cruzes encontrou 20 empresas, entre elas um banco digital, que movimentaram R$ 8 bilhões para financiar candidaturas às eleições deste ano em cidades de São Paulo.

Além disso, na capital paulista, pelo menos dois candidatos à prefeitura sofrem acusações de envolvimento com o PCC. O prefeito Ricardo Nunes, que assinou contratos com três empresas de ônibus suspeitas de serem do crime organizado; e Pablo Marçal, do PRTB, que não apenas é de um partido envolvido com o PCC, mas tem amigos pessoais na mesma situação (sem contar que ele mesmo já foi preso por desvio de dinheiro de contas bancárias e condenado por furto qualificado; só não cumpriu a pena de mais de quatro anos de prisão porque a punição prescreveu). 

Ao que tudo indica, Marçal estará no palanque de 7 de Setembro ao lado de Jair Bolsonaro, este, alvo de seis inquéritos criminais no STF e de investigações na Polícia Federal e na Receita, além de réu em dois processos criminais – sem falar nas 21 ações contra ele no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). 

O que nos leva a uma pergunta: por que a direita, defensora da violência policial contra os “bandidos”, tem tanta atração por candidatos com problemas na Justiça?

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